Mª Lucia Prisco, escritora e juiza, fala do seu novo livro entre outros assuntos.
20/11/2007
JN: O que é mais difícil: julgar a vida cotidiana ou dar vida à imaginação?
Lucia Prisco: A vida cotidiana forma-se de um acervo de acontecimentos e diversidade de comportamentos, ditados por fatores os mais variados, que seria difícil e moroso enumerar nessa singela entrevista. A minha função de Julgadora limita-se a dirimir as questões cíveis que se me apresentam, em que a procura da verdade não pode extrapolar o âmbito limitado dos autos, sempre sob a égide do axioma das lides forenses a nos ensinar que: "o que não está nos autos não está no mundo". Por aí, pode-se responder à formulação feita, com a afirmação de que é muito mais difícil julgar a vida cotidiana, cujos percalços muitas vezes fogem dos autos, a facultarem uma conclusão falha ou injusta, que dita o julgamento. É, pois, muito mais fácil dar vida à imaginação, quando se pode romper os autos que aprisionam o julgador, e espalhar, sem limites, as asas sedentas ao bel prazer do escritor.
JN: Em “Arquimimo”, seu primeiro livro, a cidade de Rio de Contas foi foco de inspiração. Neste segundo, a sua veia literária direcionou algo em especial?
Lucia Prisco: É certo que, no meu primeiro romance "Arquimimo", busquei inspiração na bucólica e sempre bela cidade da Chapada Diamantina, Rio de Contas, onde a vida artesanal, e as lembranças de um passado suntuoso, formaram a fonte fecunda em que minha imaginação se banhara fartamente. No meu segundo romance, OS IRMÃOS DA CRUZ ou MATEUS E VALDO, a ser lançado brevemente, embora não me afaste das lembranças que me povoaram a infância e mocidade, afasto-me entretanto, da bela Rio de Contas, para centrar-me em acontecimentos, (imaginários, ou não), que têm por cenário outra cidadezinha interiorana, sob os reflexos da ditadura militar, que ali repercutira de forma inusitada, e quase imperceptível. Tento satirizar a falta de consciência de um povo, condição mantida pela dominação dos meios de comunicação, e hipertrofia de uma facção política. Sem maiores pretensões, espero que o povo jequieense acolha este meu segundo filho intelectual, com a mesma simpatia e benevolência que tiveram quando do lançamento de "ARQUIMIMO".
JN: No seu ponto de vista, o hábito da leitura de pais influenciam filhos a serem ávidos leitores?
Lucia Prisco: Na minha longa jornada profissional, primeiro como professora de Português e Literatura e depois, como Juíza, aperfeiçoou-se o meu entendimento, que é, aliás, o de todos, de que o hábito da leitura é essencial para a formação cultural de um povo. Nunca se me apagam da memória os dizeres estampados na Biblioteca do Instituto de Educação Anísio Teixeira de Caetité, onde fiz o curso colegial: QUEM NÃO LÊ, MAL FALA, MAL OUVE, MÃL VÊ". Para a concretização desse ideal de leitura, em que pese as múltiplas influências nefastas que assoberbam os jovens, considero que o hábito de leitura dos pais, e os ensinamentos daí adquiridos e transmitidos aos filhos influenciam a estes a se tornarem leitores vorazes, e imunes às tentações nefastas que os tornem meros copiadores de modismos.
JN: Como integrante da nossa Academia de Letras e dona do título de Cidadã Jequieense, é possível o sonho de Cidade Educadora para Jequié, levando em consideração as ações dos nossos representantes nas camadas; municipal, estadual e federal?
Lucia Prisco: Jequié tem se destacado como centro de educação e cultura, incentivador dos que se iniciam na área das letras, como escritores. Adianto que foi ao estabelecer-me nesta acolhedora cidade que me senti tentada a ousar o sonho de tornar-me escritora, sonho contínuo e que sei inacessível, mas, que de repente pode tornar-se realidade, quem sabe? Observo também o número crescente de jequieenses que buscam a meta de Machado, Adonias, Alencar, Amado, e muitos outros, ao publicarem as mais variadas obras, muitas já imbuídas de inequívoco pendor literário. Para tanto, muito se destaca a nossa Academia Jequieense de Letras, que acolhe uma plêiade dos que ousaram e ousam na saga literária, dentre os quais, orgulhosamente me coloco. Foi também com o mais grato sentimento de orgulho e reconhecimento, que me incluí dentre os que se tornaram Cidadãos Jequieenses, por benevolência dos que assim me premiaram. Tenho me esforçado, na minha longa jornada nesta cidade, (que espero se prolongue por muito mais), em servir à Terra - Mãe, na área jurisdicional e literária, mas também e principalmente, como filha verdadeira, que recebe muito, e doa o que lhe é possível.