Jequieense Eveline Mota, repórter da TV Sudoeste, fala conosco.

26/11/2010

JN: Muitas pessoas lhe vêem todo dia na TV Sudoeste, mas não sabem da sua origem, de como tudo começou. Fale um pouco para nós de você e também do seu desejo de ingressar no jornalismo. Eveline: Sorrateiro. Ele chegou assim. A pretensão de ser jornalista nunca existiu. Juro e explico. O gosto pela música e a vocação para o canto e instrumentos já eram antigos, então queria seguir este caminho. Era muito natural. A grana curta mais as muitas despesas da família foi uma combinação crucial para eu escolher prestar vestibular numa cidade próxima à minha querida Jequié. Marquei um X de caneta azul na folha de inscrição em Comunicação Social-Jornalismo, Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, campus de Vitória da Conquista. Era 2002. A Comunicação Social, um canal enorme, abrange um universo imenso foi escolhido por achar nela um meio para trabalhar com a música. Este pensamento acabou dando certo: sete de julho de 2003 entrei para Universidade. Durante quatro semestres, artigos, reportagens nos jornais impressos, de rádio, qualquer trabalho... Tudo era falando de música. No semestre seguinte, a professora e jornalista carioca Maria Marques nos mostrou um pouco de Telejornalismo. O coração bateu forte como ao ouvir um acorde do grande Lenine. Ela me mostrou como em um minuto –muitas vezes menos- de imagens, textos e sons era possível transformar situações, ajudar, questionar. O poder da produção, a reportagem, a edição, a exibição, o imediatismo de uma matéria telejornalística me fascinaram. A cara no vídeo não me interessava. Ouvir histórias interessantes, colocá-las no ar, cobrir boas imagens com músicas envolventes surtiam um efeito maravilhoso em mim, bem maior que o EU aparecendo em imagem. Mas como fazia parte das provas, a cara no vídeo foi obrigatória. Em 2006, já terminando a Oficina de Telejornalismo II fui convidada pela mesma professora para uma seleção para o Jornal da TVE, TV educativa criada pela Uesb e acabei sendo selecionada para apresentá-lo e também produzi-lo. Foram seis meses nesta experiência até então pouco conhecida por mim, muito construtiva, ora difícil, ora sem desafios. Pensei em desistir. Fui pedra, virei telhado. Continuei. Mas faltava algo: o outro. Queria ouvir. Então pedi pra ir pra rua... Não fui demitida, fui pra reportagem. Foram mais seis meses na função de repórter. Encantador... Era isso. 11 de fevereiro de 2008 comecei na TV Sudoeste, depois de ter sido observada e chamada pelo Chefe de Redação, o jornalista e pessoa muita querida, Eduardo Lins. Fiquei um ano na função de produtora, no lugar de outra jornalista que havia deixado o cargo. A Função ajudou muito a conhecer de forma mais intensa o que era a profissão escolhida por mim. A agilidade de checar informações, o “traquejo” de falar com o outro, obter dados, criar laços, conhecer fontes, escrever objetivamente, questionar, ouvir críticas e elogios, sugestões... Isso em escala bem maior que o primeiro emprego, afinal estamos falando de uma TV que chega a mais de 60 municípios da região sudoeste da Bahia. Na saída de um outro repórter entrei para o quadro de repórteres da TV Sudoeste em 2009. Um mar de emoções. Era tudo aquilo que a função de produtora me trazia, mas acompanhada de um grande detalhe: na rua não existem as quatros paredes da redação. Na reportagem, você está ali, de frente para o fato, para o outro. Isso instiga, inspira cautela e também aflora o gosto que hoje tenho pela minha profissão. Cada vez mais o amor cresce. Ah, não esqueci a música. Continuo fazendo dela inspiração para minhas matérias. Mas agora ela divide palco com outra estrela. JN: Há tempos a imprensa foi definida como o Quarto Poder (em seguida aos poderes constitucionalmente estabelecidos: Executivo, Legislativo e Judiciário). Como pensar na imprensa em geral, que ao invés de fazer jus a esta definição tão importante, não possui a imparcialidade e usa da sua força para benefícios próprios ou alheios? Eveline: O termo e o ideal do Quarto Poder foram pela primeira vez apresentados no século 18, quando os ideais liberais eram a base para as lutas contra a burguesia. Quando os liberais iluministas iam de encontro à nobreza, isso lá na Inglaterra. Era uma espécie de olho da sociedade, que devia fiscalizar os outros três poderes. São centenas de anos de transformações sociais, econômicas, políticas e principalmente, humanas... Como o quarto poder não mudar? Não acredito que a imprensa em geral seja parcial. Creio que o Quarto Poder está divido. Ele é uma ilusão e também ainda resiste. É uma ilusão no momento em que entendemos que as questões econômicas do nosso país fazem com que nada seja parcial, nenhum segmento, nenhuma área, nenhum outro poder, nada. É uma ilusão no momento em que se assemelha ao Brasil. O jornalista Bruno H. B. Rebouças explicou o que opino agora para o site Observatório da Imprensa quando cita a frase dita por algum presidente americano “A imprensa só será livre quando o seu país assim o for”. Digo ainda que a imprensa só será democrática, quando o seu país assim o for. É uma ilusão quando os grandes centros acadêmicos formam profissionais fúteis que se envaidecem e armam sorrisos em frente às câmeras, mais artistas, menos jornalistas. Causam descrédito e desconfiança. É uma ilusão no momento em que a culpa desta imparcialidade recai apenas nos jornalistas. Em sua maioria o noticiado é aquilo que boa parte do público quer ver, ouvir, saber. Cabe a este público agora, assumir o papel de imprensa ainda existente: pensar coletivamente. O quarto poder ainda resiste quando mostra a realidade, denuncia abusos e fiscaliza. Se firma como um canal que ouve a comunidade onde o meio está inserido e transmite às outras esferas. Leva informações que fazem o público leitor, ouvinte e o telespectador a pensar de forma independente e dá sua própria opinião. Resiste quando faz com que os três poderes constituídos ajam em favor do povo. Quando profissionais, independentemente do tempo de formação e atuação que tenham, mantêm o ideal, porque não dizer, romântico e acreditam que podem mudar o meio onde vivem com o poder da informação. JN: Desde junho do ano passado, por conta de uma decisão do STF, não é mais necessário o diploma de jornalismo para o exercício da profissão (o que ainda não é veredicto final para o assunto, já que uma Proposta de Emenda Constitucional tramita na Câmara dos Deputados). Qual a sua posição sobre esta questão tão polêmica? Eveline: Por seis anos e meio estudei a língua inglesa. No final do curso recebi um diploma de conclusão e ouvi “Você agora pode ensinar em alguma escola”. Acreditei e fui atrás. Ainda era estudante de jornalismo. Tentei entrar para o quadro de professores de inúmeras escolas e ouvi outro discurso: “Nós só aceitamos professores formados em Letras”. Não me frustrei. Aceitei. A escola escolhia quem ela queria. Para os chefes da escola aquela formação fazia diferença. Entendi que havia pessoas que passaram quatro anos estudando, fizeram aquele curso e talvez estivessem mais aptas para o cargo. O meio escolheu o que era bom pra ele. Da mesma forma é o jornalismo. Com ou sem diploma, quem faz a escolha é o meio onde você pretende trabalhar. Reconheço e conheço muitos profissionais não formados, excelentes. Muitos são meus mestres atualmente. A diferença é o contato com um tipo de conhecimento só oferecida pelo universo acadêmico. Troca de experiências que te forçam a se reciclar e ser mais atual. O bom das escolas de comunicação é ensinar ao estudante o compromisso com a profissão e principalmente com a ética exigida por ela. Questões muitas vezes não ensinadas em alguns meios de trabalho. Nas salas de aulas recebemos orientações para apurar nosso senso crítico, difíceis de encontrar por aí. Se os estudantes vão aprendê-las, aí é outra história. Cabe a cada um. Eu preferi aprender. Escolhi estudar por alguns anos. Gostei e aproveitei os conhecimentos adquiridos com um pouco das opiniões de Pierre Bourdieu, de Claudio Abramo, Nelson Traquina, Cremilda Medina ou de Luiz Nova, por exemplo. Fizeram diferença. JN: E falando um pouco sobre o futuro, quais os planos para a sua carreira profissional? Eveline: É não fazer planos. Continuo com a pouca pretensão e o mesmo perfeccionismo de sempre em tudo que começo, recomeço ou continuo. Uma pitada de ambição não faz mal então, o que surgir de bom... A meta é ouvir, aprender e evoluir. Sempre.