Contraste social é gritante na estrada que corta o Brasil de Norte a Sul.
27/07/2009
Percorrer os 554 km da BR-116, a partir de Feira de Santana, é se deparar com paradoxos. O caminho é de riqueza: por ali, passam diariamente milhões de reais em produtos que cruzam o Brasil de Norte a Sul rumo ao seu mercado consumidor. No entorno, a história é outra: estão municípios e povoados em que a pobreza predomina. Mão estendida, olhar vazio e o retrato latente da pobreza a um palmo da estrada. O menino tem 10 anos, mas aparenta menos. Magro, esfarrapado, pés descalços no chão. Na beira da pista, ele observa o roncar dos caminhões. “Fico aqui todos os dias. Às vezes, os motoristas param e dão uma ajuda para gente”, explica. A rotina é quase a mesma: de manhã, escola. De tarde, ruma para as margens da rodovia para pedir esmolas, cobrando uma espécie de “pedágio social” a quem passa pela pista.
Naquele dia, tinha conseguido quatro reais, guardados em uma garrafa plástica junto a uma pequena imagem de Nossa Senhora Aparecida: “A gente precisa da santa. Ela ajuda muito”. Para o futuro, nenhuma perspectiva. O que quer ser quando crescer? “Nada”, responde resignado. Bombeiro, policial, médico, caminhoneiro? “Nada”, repete, desta vez mais enfático. O pai mora em Amargosa. A mãe, em Jequié. Enquanto isso, o menino esmola no trecho de rodovia que corta Manoel Vitorino, município com o 71° pior IDH – Índice de Desenvolvimento Humano – da Bahia.
E o menino não está só. Ao longo da via, crianças e idosos buscam na estrada a sobrevivência. Assim faz Jovelina Maria de Jesus, 61 anos, desempregada. Dos nove filhos que teve, oito foram tentar a sorte no Sudeste do País e não mais voltaram. “Aqui está difícil, não tem trabalho. Quando chove, a gente planta uma rocinha, mas não dá para nada”, lamenta Jovelina, que sonha com uma aposentadoria: “Quero sair desta vida”.
Metros adiante, a mãe, irmã e sobrinhos de Jovelina seguem a mesma sina, com os braços estendidos apontando para a estrada. E se mostram completamente alheias às concessões, pedágios e gestão de rodovias. “Para a gente, não muda nada. O que a gente precisa mesmo é de emprego”, afirma Luziene de Souza, 37 anos. Sobrinha de Jovelina, ela também mostra desalento: “A gente não tem nem água em casa, vai pensar em pedágio?”, questiona.
Alguns pedem, outros vivem do comércio informal. Entre carros e caminhões, vende-se de tudo. Tem banana, melancia, tem laranja e castanha. Tem homem e também tem criança na pista. O risco de um acidente é constante. Em comum, o ceticismo com a chegada do pedágio: “Para a gente não muda nada. As dificuldades vão continuar”, assinala o vendedor de coco, Marco Antônio.
Fonte: João Pedro Pitombo - Jornal A Tarde